A história recente tornou difícil ler esta passagem de Os Irmãos Karamazov com distanciamento. Testemunha um dom de violência que raia o demoníaco. Coloca perante nós, com preciso detalhe, uma suma dos desatres peculiares dos nossos tempos. Precisamente como gerações anteriores abriam a Bíblia, ou Virgílio, ou Shakespeare a fim de encontrar epígrafes para a experiência, assim a nossa pode ler a partir de Dostoievsky a lição para o dia. Mas não confundamos o significado deste "poema incoerente de um estudante inepto". Ele pressagia, com misteriosa presciência, os regimes totalitários do século vinte - o controlo do pensamento, os poderes aniquiladores e redentores da elite, o deleite embrutecido das massas nos rituais musicais e parecidos com danças de Nuremberga e do Palácio dos Desportos de Moscovo, o instrumento da confissão e a subordinação total da vida privada à pública.
sábado, 25 de junho de 2022
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