É verdade que dizemos que a hora da morte é incerta, mas quando dizemos isso imaginamos essa hora como situada num espaço vago e longínquo, não pensamos que ela tenha qualquer relação com o dia já começado e possa significar que a morte - ou a sua primeira tomada de posse de nós, após o que nunca mais nos largará - poderá acontecer nesta mesma tarde, tão pouco incerta, nesta tarde em que a ocupação de todas as horas está antecipadamente regulada. As pessoas insistem no sei passeio para terem dentro de um mês todo o bom ar de que necessitam, hesitaram na escolha de um casacão a levar, do cocheiro a chamar, vão de carro, têm o dia inteiro à sua frente, curto, porque querem regressar a tempo de receber uma amiga; desejam que amanhã também faça bom tempo; e não duvidam de que a morte que caminhava dentro delas noutro plano, no meio de uma impenetrável escuridão, escolheu precisamente aquele dia para entrar em cena, daí a alguns minutos, mais ou menos no momento em que o carro chegar aos Campos Elísios. Talvez aqueles que vivem habitualmente obsediados pelo pavor da singularidade própria da morte achem algo de tranquilizador nesse género de morte - nesse género de primeiro contacto com a morte -, porque aí ele reveste uma aparência conhecida, familiar, quotidiana. Foi precedida de um bom almoço e do memso passeio das pessoas de boa saúde.
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
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