domingo, 23 de novembro de 2008

O Leopardo

Nós não somos cegos, meu caro padre, somos apenas homens. Vivemos numa realidade móbil a que tentamos adaptar-nos, como as algas cedem ao impacto do mar. A imortalidade foi explicitamente prometida à Santa Igreja; a nós, como classe social, não. Para nós um paliativo que promete durar cem anos equivale à nossa eternidade. Poderemos talvez preocupar-nos com os nossos filhos, com os nossos netos; mas para além daquilo que podemos acariciar com estas mãos não temos obrigações; e eu não posso preocupar-me com isso, porque está destinado a não morrer. No seu desespero está implícito o conforto. E o senhor acredita que se ela pudesse agora, ou se puder no futuro, salvar-se a si mesma com o nosso sacrifício, não o faria? Claro que o faria, e faria bem.

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