domingo, 11 de fevereiro de 2007

O Idiota

- Uma história estúpida, e conta-se em duas palavras - começou o general todo inchado. - Há dois anos, sim!, quase há dois anos, acabavam de abrir o novo caminho-de-ferro de N..., e eu (já um paisano), tendo de tratar de alguns assuntos, extremamente importantes para mim, relacionados com a resignação do meu cargo, comprei um bilhete de primeira classe: entrei, sentei-me, fumei. Ou antes, continuei a fumar, porque tinha acendido o charuto ainda antes. Estou sozinho no compartimento. Não é proibido fumar, mas também não é permitido; como de costume, é meio permitido; e também, isso depende da pessoa que fuma. A janela está aberta. De repente, mesmo ao sinal de partida, instalam-se ali duas senhoras com um caniche, mesmo à minha frente; vinham atrasadas; uma, ataviada do modo mais pomposo, de vestido azul-claro; a outra, com um mais modesto, de seda preta, com romeira. De aparência bastante boa, olhares altivos, falam inglês. Eu, claro, continuo a fumar. Ou seja, de início até pensei no assunto, mas depois continuei a fumar para a janela, porque estava aberta. O caniche vai deitado nos joelhos da senhora de azul-claro; pequenino, do tamanho do meu punho, preto e de patas brancas, o que é uma raridade. A coleira é de prata com sinete. Continuo nas calmas. Mas noto que as damas parecem zangadas, por causa do charuto, claro. Uma fita-me com o lornhão, de tartaruga. Eu continuo na mesma, até porque elas não me dizem nada! Se me dissessem, se avisassem, se me pedissem, porque, afinal de contas, existe uma língua humana! Em vez disso calam-se... e de repente (notem, sem qualquer aviso, isto é, sem o mínimo aviso, como se tivesse ficado desvairada) a de azul-claro arranca-me o charuto da mão e atira-o pela janela fora. O comboio corre a todo o vapor, eu fico a olhar como um maluco. Uma selvagem, uma mulher selvagem, literalmente no estado de selvajaria; mas, de resto, corpulenta, cheia, alta, loira, faces coradas (até de mais), os olhos a chisparem raios. Eu, sem dizem uma palavra, com uma cortesia extraordinária, uma cortesia absoluta, uma cortesia, por assim dizer, mais fina, levo dois dedos ao caniche, agarro-o delicadamente pelo cachaço e zás - janela fora atrás do charuto! Só ganiu! O comboio continua a todo o vapor...

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